… numa altura em que se homenageia (onde destaco as versões de Tiago Bettencourt; Per7ume; Mesa; Oioai e The Vicious Five) esse grande e ímpar nome da musica Portuguesa que é Carlos Paião, recordo um dos seus temas que na minha singela opinião é dos mais carismáticos e reveladores da sua personagem galhofeira e satírica. Uma voz que se calou cedo demais para enorme dolência de todo um país mas que perpetuará na sua memória.
À medida que ouvia esta música, subitamente, vislumbrou-se-me na mente a imagem de uma certa pessoa também ela com queda para a folia e que cantarola o fado como ninguém. Falo é claro do meu amigo de longa data Império cujas semelhanças com Carlos Paião não se resumem a meras coincidências. Não é que este último até de Índio se disfarçava!
"A amizade é o que fica depois das teias da lei. Por isso até qualquer dia, que da vossa simpatia nunca mais me esquecerei"
Carlos Paião
2 comentários:
vê lá se queres umas broinhas de mel......
famumbico....
badalhoco
Carlos Paião faria no próximo dia 1 de Novembro 51 anos. Recordo esta figura da canção portuguesa quando se completam 20 anos da sua morte (26 de Agosto de 1988) e do lançamento do último trabalho, o LP “Intervalo”, e 30 anos da vitória no festival da canção de Ílhavo (15 de Dezembro de 1978).
Existem pessoas que passam na vida do mundo e que deixam a sua marca, não pela longevidade da sua idade, mas por se destacarem dos demais, com uma espécie de marca de água, que se vê através da luz.
Um desses nomes é Carlos Paião que, embora nascido em Coimbra, foi um ilhavense de alma e coração. A sua vida de trinta anos – de um rapaz aparentemente comum – foi uma estrela cadente que passou.
Alguns tiveram o privilégio de lhe tocar com as mãos, e muitos têm o gosto de a ver no céu das suas vidas.
Que há de anormal na vida de um rapaz que o destino levou quando a vida ganha verdadeiramente fôlego e se desenha em traços largos?
Numa época em que qualquer pessoa canta, representa, e é moda ser vedeta (seja por que motivo for), este rapaz simples deixou um legado que ainda hoje é difícil compreender e explicar na soma de trinta anos de vida.
Médico de formação, autor de inspiração, cantor de talento, Carlos Paião cedo manifestou os seus dotes artísticos. Era com facilidade que jogava com as palavras, delas tirava o partido dos sons e dos seus duplos sentidos.
As suas canções (algumas centenas) percorrem vários géneros musicais, o que desde logo é notável. Autores há que se se especializam numa determinada área da criatividade e por lá ficam.
Carlos Paião, porque desprendido de tudo o que é formal, ora escrevia uma canção de humor (para Herman José ou Raul Solnado, por exemplo), ora sentimental (para Cândida Branca Flor), ora canções alegres como o “Senhor extraterrestre”, de Amália, que esteve num livro de leitura da escola, ora temas telúricos de rara beleza, e lembre-se “Eles foram tão longe” ou “Lá longe, Senhora”.
Recordado a obra deste homem, poderá ver-se nas cantigas uma técnica de estranho nome: a do “bolo de bolacha”. As suas obras são para toda a gente: para o intelectual que lê nas entrelinhas a crítica que o autor quer fazer, para os ouvidos comuns, que acham a letra muito bem feita e não raramente começam a trautear a música, e até para as crianças, que lhe acham muita graça.
As crianças foram sempre público fiel e encantado de Carlos Paião.
Muitas vezes se fala na precocidade e genialidade do músico. Nada de mais verdadeiro.
Mas há, possivelmente, naquilo que escreveu – frutos intemporais e de safra que aparecem de tempos a tempos –, raízes profundamente portuguesas.
Há nele um toque de Alberto Janes, outro tanto da música popular portuguesa, e ainda alguma coisa dos seus antepassados paternos e maternos que se apaixonaram também pela música, sendo o melhor exemplo o primo Manuel Paião.
Este autor ilhavense, conjuntamente com Eduardo Damas assinou umas boas dezenas de sucessos, como “Ó tempo volta p’ra trás”. São estas raízes que mais valorizam Carlos Paião. Muitas vezes os artistas, por força da sua intenção de se valorizarem, pretendem ser absolutamente originais.
Mas... como tudo o que nasce sem raiz acaba por flutuar no ar e é levado pelo vento.
Paião enraizou-se bem naquilo que de melhor tem a música portuguesa e a língua pátria e depois, sim, fez o seu caminho, de afirmação artística, com uma profunda originalidade, talento e generosidade.
Será dos traços mais belos do seu carácter. Nunca guardou o melhor que tinha para si mesmo, ele que também foi intérprete. Partilhou, ajudou e motivou muitos artistas portugueses, muitos deles ainda por aí, nos palcos. Tudo isto num rapaz cuja vida se suspendeu aos trinta anos.
Avesso a vaidades, simples no trato e rigoroso em tudo quanto fazia, Carlos Paião passaria neste ano de 2008 os seus cinquenta e um anos de vida, trinta anos depois da vitória no Festival da Canção de Ílhavo e vinte depois do seu LP “Intervalo”.
Foi efectivamente um intervalo, o de Carlos Paião. Os intervalos são sempre para descanso do artista, porque a segunda parte é sempre a melhor.
E a de Carlos de Paião é sem dúvida a melhor: é a da paz, do reconhecimento em pequenos e grandes, mais novos ou menos novos, do seu trabalho como artista: fresco, leve, mas sempre com mensagem e sentimento, e também como homem. Disse um dia Fernando Pessoa que “partem cedo os que os deuses amam”.
Permitam-me que diga que Carlos Paião estará junto de Deus, no Seu Tempo, certamente ensinando a querubins e serafins novas melodias de louvar a Vida, ele que a viveu na verdade e generosidade e estará de sorriso nos lábios, porque sempre amou a Vida, e contra ela nada nem ninguém pode coisa alguma (nem a morte).
Enviar um comentário